sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Dilma, a refém-eleita*


Dilma Roussef recebeu 48,366% dos votos apurados. Isto significa que a maioria dos eleitores que compareceram às urnas (51,633%) lhe negaram um segundo mandato. Devemos lembrar, contudo, que a dimensão aritmética da democracia legitima igualmente a vitória por esmagadora maioria e a vitória por margens tão diminutas. Entretanto, há um significado atemorizante – ao menos para quem deseja à presidente reeleita um governo mais eficiente e menos envolto em “malfeitos” – extraível das circunstâncias desta reeleição.
Em 2010 a oposição e parte da imprensa a chamavam de poste. Faziam-no para destacar sua irrelevância política e iluminar o fato de que a luz-que-atrai-votos pertencia a um outro ator, que fingia sair de cena para, ungindo a sua ministra, elegê-la Presidente da República sem abandonar os cordéis. Desde o primeiro dia de 2011, o que se viu foi a aplicação de técnicas de usurpação do mandato presidencial.
Dilma Roussef iniciou seu primeiro mandato politicamente constrangida, o que a fez submeter-se às exigências de seu próprio partido e também as de sua enorme, indisciplinada e venal base de apoio no Congresso. Além de aceitar ministros impostos pelo “dono da luz”, o poste teve de ampliar o número de ministérios para acomodar os anseios nada republicanos dos que a apoiavam. Se não sabia, Dilma, em seu voluntarismo, teve de aprender que, em contextos assim, a política é um jogo de xadrez em que a ética vive em xeque-mate.

E o contexto não se alterou significativamente. Quase abandonada por Lula e parte do PT às próprias limitações políticas, como forma de punição por seus rompantes de independência, a presidente por pouco não fracassou em sua tentativa de reeleição. Saiu das urnas sendo obrigada a adotar tons conciliatórios, não por que seja seu perfil, mas porque as luzes continuam vindo de outras fontes. Refém estava, refém continuará.
Hostilizada silenciosamente por parte de seu próprio partido, chantageada por sua base de apoio parlamentar e enfrentando a ira da oposição, Dilma Roussef não governará segundo seu programa, coisa que já não fez no primeiro mandato. Outra vez governará, não segundo seus princípios morais, mas de acordo com os princípios que orientam profissionais da política, tais como Renan Calheiros, Henrique Alves e Eduardo Cunha, para citar apenas alguns dos nomes que se movimentam em nome do sistema representativo sem qualquer compromisso com os fundamentos constitucionais do instituto da representatividade.
Dizia o poeta que ninguém é mais escravo do que aquele que se considera livre sem sê-lo. Dilma decerto não se considera livre, pois tem consciência de seus senhores. Sabe também que interesses movimentam os servos da soberania oculta que se esconde nas falhas da democracia. Mas sua consciência não lhe fortaleceu, ao menos até aqui.

A refém eleita para presidir o Brasil pouco poderá fazer para imprimir ao novo mandato uma marca distinta daquela exibidas nos últimos quatro anos. O presidencialismo como conhecemos, enquanto assentado nas regras vigentes, está fadado a produzir párias do poder que ostentam a pompa funcional enquanto não passam de serviçais de interesses quase sempre contrários à ética inscrita nas normas constitucionais.

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